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Codego ignorou pareceres a favor de venda de áreas a filho de Cachoeira a preço de mercado
Despachos da CGE e do ex-presidente apontavam desvio de finalidade em terreno para construção de shopping e defendiam valor de cerca de R$ 5 milhões; área foi vendida a R$ 25 mil
Por: Fabiana Pulcineli
Vendida por R$ 25,8 mil à empresa de Matheus Henrique Aprígio Ramos, filho do contraventor Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, a área para construção de shopping no Distrito Agroindustrial de Anápolis (Daia) deveria valer cerca de R$ 5 milhões, segundo dois pareceres jurídicos que recomendaram a negociação a preço de mercado à Companhia de Desenvolvimento Econômico de Goiás (Codego), do governo de Goiás. Os documentos, assinados pela Controladoria Geral do Estado (CGE) e pelo ex-presidente da companhia Pedro Sales, não estão no processo administrativo físico da venda da área, ao qual o POPULAR teve acesso.
Os pareceres também questionam a falta de demonstração de capacidade financeira por parte da empresa ETS Importação e Exportação, que tem Matheus como proprietário, para o empreendimento. O Ministério Público Estadual (MP-GO) e a Polícia Civil (PC-GO) estão investigando o caso.
Como o POPULAR mostrou na semana passada, em 20 de abril, a atual gestão da Codego, comandada por Marcos Cabral, oficializou a venda de duas áreas, que totalizam 22 mil metros quadrados, à ETS. No entendimento da CGE e do ex-presidente, há desvio de finalidade, já que áreas do Daia servem para atrair indústrias e não para construção de centro comercial. Assim, haveria a obrigação de venda sem subvenção governamental.
Os despachos jurídicos consideram que os preços de tabela da Codego, de R$ 2,45 o metro quadrado, só valeriam para instalação de indústrias. As indicações informais do ano passado eram de que o valor de mercado seria de pelo menos R$ 450 o metro quadrado.
Pedro Sales, hoje na presidência da Agência Goiana de Infraestrutura e Transportes (Goinfra), assumiu a Codego em agosto do ano passado, após suspeitas de irregularidades praticadas pela direção. Ao se deparar com o caso da área para o shopping, ele fez um despacho com entendimento de que a destinação ao empreendimento fugia à finalidade das áreas do Daia, solicitando avaliação do valor de mercado e parecer da CGE.
No início de outubro, Pedro deixou a Codego para assumir a Goinfra. A resposta da CGE foi protocolada logo depois, em 10 de outubro, seguindo o mesmo entendimento do ex-presidente. “Sugerimos que seja informado as empresas ETS e DAIA BUSINESS CENTER PARTICIPAÇÕES LTDA sobre a deliberação constante da ata de 18/02/2011, de que a comercialização de áreas para atividades alheias à indústria será pelo valor do m² de mercado”, diz o documento.
A CGE também sugeriu “encontro de contas” para que a Codego indenizasse a ETS pela construção da nova sede da 3ª Delegacia Regional de Polícia Civil, caso a empresa não aceitasse o valor de mercado na área. “Caso as empresas venham a questionar o estabelecido, que seja proposto um encontro de contas, considerando o valor da edificação da nova sede da Delegacia e o valor de
mercado da área de 11.004,20 m², em avaliação a ser realizada pela área de engenharia da Codego, conforme laudos com a devida anotação de responsabilização técnica ART/CREA”.
É que, como o POPULAR mostrou na semana passada, a construção da nova sede fez parte da negociação, como permuta para que a ETS tivesse a área destinada ao shopping. Naquele terreno, funcionava a delegacia, mas havia interesse da Polícia Civil em uma sede mais espaço. A empresa do filho de Cachoeira negociou diretamente com a PC-GO para a troca, respaldada mais tarde pela Codego. Segundo a ETS, o valor orçado da nova sede é de R$ 1.227.306,12. Considerando o preço avaliado em R$ 5 milhões, a empresa teria então de pagar ao Estado R$ 3,77 milhões.
Pedro Sales confirmou o despacho. “A minha posição foi de discordância do valor subvencionado. E fiz o pedido de parecer da CGE, que foi no mesmo sentido”, diz.
Em nota, a direção da Codego afirmou que os pareceres não foram anexados ao processo físico, mas que tramitam no Sistema Eletrônico de Informação (SEI), plataforma de gestão de processos administrativos do governo estadual.
“É oportuno esclarecer que a ETS adquiriu a cessão seguindo o mesmo trâmite que os demais investidores atualmente parceiros da companhia. A ETS, no entanto, além do valor pago, também construiu a nova sede da 3ª Delegacia Regional de Polícia, beneficiando colaboradores da Polícia Civil e moradores de Anápolis e outras onze cidades ao redor”, afirma a nota, para completar: “Desse modo, ainda que tenha adquirido a cessão de área a um preço abaixo do mercado, conforme estabelecido pelo Regulamento de Áreas da Codego, a empresa se comprometeu a construir um equipamento público, que embora cedido à Secretaria de Estado de Segurança Pública de Goiás (SSP-GO), pertence à estatal, assim como a área na qual fora edificada”.
A direção da Codego diz ainda que as áreas podem ser retomadas pela companhia em caso de uso indevido ou desinteresse da gestão. “Novamente esclarecemos que as áreas cedidas pela Companhia a potenciais investidores são bens reversíveis, de modo que podem ser devolvidos à Codego caso não haja mais interesse público na manutenção da cessão, em especial quanto à função de social na geração de emprego e renda”.
A CGE não quis comentar o parecer, alegando que é um processo “ainda em trâmite, não encerrado”.
Cachoeira divulgou nota na noite desta segunda-feira (8) apontando sensacionalismo e tentativa de transformar negociação comum em escândalo.