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Apuração sobre fura-fila de vacina contra Covid alcança ao menos 15 cidades
Denúncias encaminhadas ao Ministério Público Estadual têm aumentado. Suspeitas envolvem servidores e particulares
Goiás já possui pelo menos 15 cidades que estão com investigações em andamento feitas pelo Ministério Público do Estado (MP-GO) sobre casos suspeitos de ‘fura-fila’ na vacinação contra o coronavírus. As irregularidades são, em sua maioria, para beneficiar autoridades, familiares e pessoas que trabalham com profissionais da saúde. O MP-GO já arquivou uma investigação por falta de indícios em Crixás e confirmou um caso em Pires do Rio, onde o secretário municipal de Saúde, que tomou a dose também deu para a esposa. Ele foi afastado, assinou acordo de não persecução penal, teve de pagar multa de R$ 50 mil, além de ter de prestar cem horas de serviço no Hospital Municipal da cidade.
Existem ainda duas outras cidades – Caçu e Leopoldo de Bulhões – que possuem investigações abertas relacionadas à vacinação contra a Covid-19, mas as promotorias não informaram se são de casos suspeitos de fura-fila ou não, nem qual o estágio da investigação. A assessoria de imprensa do MP-GO reforçou ainda que exista a possibilidade de outras cidades possuírem investigações de casos semelhantes abertas. A filtragem das cidades com procedimentos do tipo instaurados é complexa, pois não existe um controle centralizado.
Nesta quinta-feira (11), o MP-GO divulgou a investigação que está sendo feita no município de Orizona. Na lista de vacinação divulgada pela prefeitura consta o nome de personal trainers, médicos veterinários, funcionários públicos, agentes públicos e até mesmo o do próprio secretário municipal de saúde. O promotor responsável, Lucas César Ferreira, informou que a lista ainda está sendo analisada, mas que não param de chegar ligações da população na promotoria indicando mais nomes que estariam irregulares. O secretário municipal de Saúde, Renato Cunha, informou que o município está seguindo rigorosamente as determinações do Ministério da Saúde.
Em Nova Veneza ocorreu algo parecido. O titular da Secretaria Municipal de Saúde, Dejair José do Carmo, de 59 anos, chegou a admitir que recebeu a dose da vacina. A justificativa foi de que ele foi vacinado porque mora com um irmão que tem paralisia cerebral e não podia passar a doença para ele. A promotora responsável pela cidade, Elaini Pires, pediu explicações à administração pública.
Fazendeiros
Em Ceres, outro caso também chamou a atenção: donos de hospitais incluíram na relação de contratados, famílias inteiras, para que elas pudessem receber a vacina. Dentre eles, estão pais de médicos, que são proprietários rurais e aparecem como auxiliares gerais da unidade de saúde e uma ex-primeira dama da cidade que recebeu a vacina como auxiliar de coleta. A administração pública da cidade, afirmou ter se surpreendido com a ação dos donos da unidade de saúde.
O promotor que conduz o caso, Marcos Rios, comunicou que a titular da secretaria municipal de Saúde da cidade, Marjuery Seabra, e a responsável pela Vigilância Epidemiológica do município, Heloiza Lago, terão de responder por improbidade administrativa. Heloiza afirma que os nomes das pessoas foram incluído na lista de vacinados do município sem a devida verificação por parte da pasta, mas que eles não acreditavam que o hospital “agiria de má fé”, colocando nomes de parentes como profissionais da saúde.
De acordo com o Ministério Público Federal, esta ação pode ser criminal ou administrativa, sendo que estas pessoas estão sujeitas a multa e condenação pelo crime de peculato, que tem pena de até 12 anos.
Política
Em Iporá, o prefeito da cidade, Naçoitan Leite (PSDB), também foi acusado de furar a fila da vacinação e de beneficiar a si e também aos familiares. O prefeito e a defesa dele negaram que ele ou parentes tenham se vacinado. Ele chegou a fazer um exame para verificar anticorpos com a intenção de provar que não recebeu nenhuma dose da vacina contra a Covid-19, mas mesmo o resultado negativo não evidencia que ele não tenha sido imunizado.
Em Catalão, o caso de uma atendente de uma clínica radiológica que teria sido vacinada sem fazer parte do grupo prioritário, ganhou as redes sociais. Em nota, o município comunicou que está investigando a situação, que preliminarmente não havia constatado nenhuma irregularidade.
Secretária de médico é investigada
Em Goiânia, também existe uma investigação da secretária de um médico que teria sido vacinada fora do grupo prioritário. Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) informou que “está tomando todas as medidas quanto às denúncias de possíveis casos de ‘fura-fila’”, sendo que dentre as ações está o encaminhando dos casos para órgãos fiscalizadores como, por exemplo, Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO).
Já em Senador Canedo, a publicação de um vídeo de um homem sendo vacinado levantou suspeitas se ele estaria ou não furando fila. De acordo com o MP-GO, existem investigações no município sobre infração de medida sanitária e violação aos princípios administrativos. Em nota, a assessoria de imprensa do município comunicou que a pessoa em questão trabalha no Posto de Saúde da Família (PSF) do Parque Alvorada, unidade de referência no atendimento a pacientes com a doença, e se encaixa “no perfil dos trabalhadores de apoio, que também são considerados servidores da saúde que estão na linha de frente no combate à pandemia do novo coronavírus.”
Em Goiatuba e Guapó, as investigações também são voltadas para políticos e parentes. Em Goiatuba, cidadãos relataram que políticos e servidores do primeiro escalão da prefeitura estariam sendo imunizados na frente de pessoas que fazem parte do grupo prioritário. A Secretaria Municipal de Saúde de Goiatuba informou, por meio de nota, que essas informações não procedem e são “absoluta inverdade”. De acordo com a pasta, o município possui um acordo de cooperação com a promotoria da cidade visando dar transparência para o processo de vacinação, fazendo um “informe diário das doses aplicadas nos grupos prioritários com o envio de listas com a respectiva identificação e documentação de cada vacinado”.
O secretário municipal de Saúde de Guapó, Wilmar Queiroz, também nega qualquer tipo de ação irregular no processo de vacinação na cidade. “Temos enviado a relação de doses aplicadas para o Ministério Público e deixado à disposição da população no nosso site e na nossa página do Facebook. Agimos com transparência o tempo todo com a população”, pontua.
Vale ressaltar que, na capital, o ex-deputado federal Jovair Arantes, de 69 anos, foi vacinado usando o registro do Conselho Regional de Odontologia (CRO). O Conselho chegou a comunicar que não houve irregularidade na vacinação do ex-deputado federal e que o CRO dele está ativo. Entretanto, Arantes afirmou que atende pacientes apenas esporadicamente, não estando na linha de frente do enfrentamento à Covid-19, que são prioridade na vacinação.
Profissionais recorrem ao MP
Em Santa Helena de Goiás foi instaurado um procedimento para apurar possíveis ‘furadas de fila’ na cidade. Profissionais do Hospital de Urgência da Região Sudoeste (Hurso), referência no tratamento da Covid-19, teriam sido incluídos na lista de vacinação apenas depois da intervenção do MP-GO. Foram expedidas recomendações para o município seguir as determinações dos Planos Nacional e Estadual de Vacinação. Após a orientação, as diretrizes passaram a ser respeitadas, diz o MP.
Em Pirenópolis, também existe uma investigação sobre pessoas que teriam furado a fila da vacinação. “O MP-GO nos pediu uma lista com as pessoas que foram vacinadas. Eu enviei para eles essa lista com o nome e função de cada uma das pessoas vacinadas”, diz Hiumara Amâncio da Luz Goulão, diretora de Vigilância em Saúde da cidade.
Relatos de pessoas fora do grupo prioritário sendo vacinadas também ocorreram em Aparecida de Goiânia, Santa Rita do Araguaia, Santa Fé de Goiás e Mineiros. Em Aparecida, o MP-GO solicitou ao município a criação de um “vacinômetro”, que permite acompanhar o número de vacinados da cidade. Em Mineiros, o município teria adiantado a vacinação de idosos, sendo que um dos beneficiados foi o ex-prefeito da cidade, Agenor Rezende. A reportagem entrou em contato com as secretarias de Saúde dos municípios, mas não obteve resposta até o fechamento desta reportagem.