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Bolsonaro passa a defender vacina para diminuir desgaste no governo
Com mais de 270 mil mortos pela Covid-19 no País e a entrada do ex-presidente Lula como seu provável adversário em 2022, presidente muda discurso
Desde o início da disseminação do novo coronavírus, no começo de 2020, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sempre falou e agiu em confronto com as medidas de proteção, em especial a política de isolamento da população.
Ele já usou as palavras histeria e fantasia para classificar a reação da população e da imprensa à pandemia. Dias atrás, por exemplo, afirmou: “Nós temos que enfrentar os nossos problemas, chega de frescura e de mimimi. Vão ficar chorando até quando?”.
Bolsonaro também distribuiu remédios ineficazes contra a doença, incentivou aglomerações, atuou contra a compra de vacinas, espalhou informações falsas sobre a Covid-19 e fez campanhas de desobediência a medidas de proteção, como o uso de máscaras.
Agora, porém, diante do pior momento da pandemia, com mais de 270 mil mortos no país, e da entrada do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como seu provável adversário na disputa pela Presidência em 2022, Bolsonaro tem ensaiado uma adaptação do discurso e uma reconstrução de sua narrativa sobre o tema.
A avaliação do entorno presidencial é que, devido ao recrudescimento da pandemia, o governo precisa abraçar o “Plano Vacina” e tentar se descolar do rótulo de negacionista – imagem conquistada por Bolsonaro após diversas declarações questionando imunizantes e o isolamento social e defendendo tratamentos ineficazes para a doença.
“Plano Vacina”, como mostrou o jornal Folha de S.Paulo, é como aliados de Bolsonaro apelidaram uma ofensiva deflagrada para tentar estancar a perda de popularidade do mandatário.
Apesar de não ter abandonado a defesa de medicamentos sem eficácia e as críticas a prefeitos e governadores pelas medidas restritivas, o presidente incorporou um personagem que tem a vacina como prioridade, deixando para trás a campanha anti-imunização que protagonizava até recentemente.
Pfizer
A estratégia, que começou a ser delineada na semana passada, foi explicitada nesta segunda-feira (8). Na tentativa de rebater o desgaste causado pela recusa no ano passado de vacinas da Pfizer pela gestão federal, o Palácio do Planalto entrou em contato com a farmacêutica.
Segundo assessores presidenciais, integrantes da Casa Civil procuraram executivos da empresa na última sexta-feira (5) e pediram uma videoconferência com o presidente, que foi realizada nesta segunda com a participação do CEO mundial da farmacêutica, Albert Bourla.
Bolsonaro seguiu em frente com o plano nesta quarta-feira (10), em discurso no Planalto. Ao contrário de seu comportamento desde o início da pandemia, falou em “seriedade” e “responsabilidade” na gestão da crise, além de dizer que o governo federal não poupou esforços e tem sido um exemplo para o mundo nesse enfrentamento.
No mesmo dia, logo após o ex-presidente Lula fazer pronunciamento em que criticou Bolsonaro por sua atuação durante a pandemia, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho mais velho do presidente, pediu para que seus seguidores no aplicativo Telegram compartilhassem até viralizar uma imagem de seu pai com a mensagem “nossa arma é a vacina”.
A postura pró-vacina do presidente, no entanto, não tem convencido nem mesmo deputados da base aliada. Eles lembram que Bolsonaro já moderou o discurso em outras ocasiões, mas, na sequência, voltou a adotar retórica agressiva, recorrente em sua trajetória política.
Como a Folha de S.Paulo mostrou na semana passada, a sequência de acontecimentos ligados à pandemia podem ter contribuído para esse avanço do desgaste digital do presidente.
Desde o início do ano, após o fim do pagamento das parcelas do auxílio emergencial, o país conviveu com a crise da falta de oxigênio no Amazonas, o atraso no processo de vacinação e novos recordes de mortos e contaminados pela Covid-19.
Bolsonaro perdeu desde o início deste ano parte de sua base de apoio digital e ainda viu a aproximação do ex-presidente Lula (PT) no ranking de popularidade digital.
A popularidade nas redes sociais é o principal trunfo de Bolsonaro em busca de sua reeleição no ano que vem, assim como foi em 2018 para a sua eleição ao Palácio do Planalto, quase sem tempo de TV na propaganda eleitoral, e tem sido no dia a dia de seu governo.
A queda de patamar de Bolsonaro aparece em atualização nesta semana do ranking do Índice de Popularidade Digital (IPD), elaborado pela consultoria Quaest. A métrica avalia o desempenho de personalidades da política nacional nas plataformas Facebook, Instagram, Twitter, YouTube, Wikipedia e Google.
Bolsonaro segue na primeira colocação do ranking, dentre uma lista de 13 nomes que devem influenciar as eleições presidenciais de 2022. O presidente, porém, está em um patamar 20 pontos abaixo em relação ao que acumulava em 2020.
O IPD é medido em uma escala de 0 a 100, em que o maior valor representa o máximo de popularidade. Bolsonaro saiu da casa dos 80 pontos no ano passado e agora se fixou no patamar de 60.
Presidente volta a atacar medidas restritivas
Um dia após ensaiar um tom mais moderado, usando máscara e fazendo uma defesa mais amena de procedimentos ineficazes, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) voltou a atacar governadores que estão adotando medidas restritivas para tentar conter a disseminação do novo coronavírus.
Em audiência virtual com pequenos e micro empresários, ao lado do ministro Paulo Guedes (Economia), nesta quinta-feira (11), o presidente disse que “lockdown não é remédio” e que governadores que restringem serviços em seus Estados estão encampando uma luta pelo poder.
“Até quando nós podemos aguentar esta irresponsabilidade do lockdown? Estou preocupado com vida, sim”, questionou Bolsonaro. “Até quando nossa economia vai resistir? Que se colapsar, vai ser uma desgraça. Que poderemos ter brevemente? Invasão a supermercado, fogo em ônibus, greves, piquetes, paralisações. Onde vamos chegar?”
Em 25 de março do ano passado, ao falar com jornalistas e criticar ações tomadas por governadores, Bolsonaro mencionou pela primeira vez o risco de saques a supermercados, o que não aconteceu até um ano depois.
“O caos está aí. Detalhe: se tivermos problemas, que poderemos ter, os mais variados no Brasil, como saques a supermercados, entre outras coisas, o vírus continuará entre nós também”, afirmou na época.
Ele citou dois governadores que adotaram medidas do tipo – seu às vezes aliado Ibaneis Rocha (MDB-DF) e seu adversário declarado João Doria (PSDB-SP).
“Nós aqui buscamos salvar empregos e, na ponta da linha, um ou outro, como o de São Paulo, por exemplo, vai para a destruição”, afirmou Bolsonaro, logo após Doria anunciar uma “fase emergencial” mais dura de seu plano de combate à pandemia.
O presidente se queixou das medidas de restrição “até para cancelar o futebol”, novamente aludindo a medidas anunciadas por Doria. “Ficamos praticamente um ano em lockdown. E começamos este ano, como estamos vendo em alguns Estados no Brasil, novas medidas seriamente restritivas. Até para cancelar o futebol”, disse Bolsonaro.
Para o presidente, a adoção de medida restritiva tem apenas uma consequência, que, para ele, é “transformar os pobres em mais pobres”. “Sou preocupado com vidas, antes que peguem um extrato da minha conversa, alguém, e publique nos jornais como se fosse o presidente sem coração. Mas, como sempre disse, a economia e a vida têm que andar de mãos dadas.”
Jair Bolsonaro disse que, no DF, onde está em vigor um toque de recolher entre 22h e 5h, “toma-se medida, por decreto, de estado de sítio”. O presidente disse ouvir das pessoas que elas querem trabalhar. “Quem é que rema contra isso daí? Com que intenção? Não vou falar que não tem coração, que coração já demonstrou que não tem. Agora, tem uma tremenda ambição. Parece que tem gente que está lutando pelo poder e só consegue atingir a figura do presidente da República se continuar tomando medidas como essas.”