O servidor do Ministério da Saúde Luis Ricardo e seu irmão, o deputado Luis Miranda (DEM-DF), reforçaram à CPI da Covid no Senado nesta sexta-feira (25) que o presidente Jair Bolsonaro foi alertado sobre supostas irregularidades na compra da vacina indiana Covaxin.

Eles ainda apontaram possíveis erros na documentação usada para pedir a importação das doses e, sem dar detalhes, mencionaram cobrança de propina durante a negociação por um imunizante. Segundo Luis Ricardo, a ofensiva de chefes da pasta pela importação das doses ocorreu mesmo após técnicos perceberem, na documentação, dados diferentes daqueles registrados no contrato. “Toda a equipe do setor não se sentiu confortável com essa pressão e a falta de documentos. Como meus dois superiores estavam pressionando, eu acionei e conversei com o meu irmão. Que passou ao presidente”, disse o servidor público.

Luis Ricardo citou à CPI relato de que a negociação por uma vacina havia travado por cobrança de propina de gestores da pasta.

“O ministério estava sem vacina e um colega de trabalho, Rodrigo, servidor, me disse que tinha um rapaz que vendia vacina e que esse rapaz disse que os seus, alguns gestores, estavam pedindo propina”, afirmou o servidor. O diálogo teria ocorrido com um servidor terceirizado da Saúde chamado Rodrigo de Lima.

O jornal Folha de S.Paulo revelou no último dia 18 que o servidor já havia dito ao MPF (Ministério Público Federal), em 31 de março, que recebeu uma “pressão atípica” para agilizar a importação da vacina. Dias antes, em 20 de março, o servidor e o deputado foram até o presidente Bolsonaro para alertar sobre as supostas irregularidades.

As declarações sobre a Covaxin arrastaram Bolsonaro ao centro das investigações da CPI da Covid. O presidente pediu para a Polícia Federal investigar o deputado e o servidor, mas ainda não explicou se encaminhou os alertas de irregularidades.

O deputado Luis Miranda disse que avisou o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello sobre a denúncia levada a Bolsonaro. “Expliquei para Pazuello de forma resumida… Aí ele olhou pra minha cara com uma cara de descontentamento e falou assim: ‘Luis, no duro, mas nessa semana, é certeza, eu vou ser exonerado. Eu tenho conhecimento de algumas coisas, tento coibir, mas, exatamente por eu não compactuar com determinadas situações, é que, assim, eu vou ser exonerado’.”

O parlamentar mostrou à CPI uma imagem de conversa com o irmão pelo celular, que menciona o suposto pedido de propina na Saúde. O diálogo ocorreu em 20 de março deste ano.

“Aquele rapaz que me procurou dizendo que tem vacina. Disse que não assinaram porque os caras cobraram dele propinas para assinar o contrato. Vou perguntar se ele tem provas”, disse o servidor público ao deputado.

A imagem mostra que, em seguida, Luís Ricardo relatou ter recebido “mais uma ligação” pedindo para acelerar o trâmite de importação da vacina. O telefonema partiu do coordenador dele, segundo o print da tela.

O governo fechou contrato para compra de 20 milhões de doses da Covaxin em 25 de fevereiro, por R$ 1,6 bilhão, quando tentava aumentar o portfólio de imunizantes e reduzir a dependência da Coronavac, que chegou a ser chamada por Bolsonaro de “vacina chinesa do João Doria”.

O deputado e o servidor disseram à CPI que Bolsonaro prometeu encaminhar os indícios de irregularidades à direção da PF. Miranda ainda afirmou que o presidente especulou ligação de um parlamentar com o caso.

“O presidente entendeu a gravidade. Olhando os meus olhos, ele falou: ‘Isso é grave’. Não me recordo do nome do parlamentar, mas ele até citou um nome pra mim, dizendo: ‘Isso é coisa de fulano’”, relatou Miranda.

Depois, em resposta à senadora Simone Tebet (MDB-MS), Miranda disse que Bolsonaro afirmou que as suspeitas sobre compra da vacina indiana Covaxin eram coisa do “Ricardo Barros (PP-PR)”, líder do governo na Câmara. “A senhora também sabe que foi o Ricardo Barros que o presidente falou. Eu não me sinto pressionado para falar, eu queria ter falado desde o primeiro momento, mas é porque vocês não sabem o que vou passar.”

“Vocês sabem quem é, né? Sabem que ali é foda. Se eu mexo nisso aí, você já viu a merda que vai dar, né. Isso é fulano. Vocês sabem que é fulano”, disse Bolsonaro, segundo Miranda.

Erros

Luis Ricardo disse aos senadores que havia erros na documentação apresentada pela Precisa Medicamentos, representante da fabricante Bharat Biotech no Brasil. Segundo ele, a invoice (fatura) exigida pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para liberar a importação estava no nome da Madison, empresa de Singapura, ligada à Bharat. O documento ainda citava pagamento antecipado de US$ 45 milhões pelas doses, que estariam próximas do fim da validade.

Estes dados eram diferentes do que havia sido registrado no contrato do governo federal com a Precisa, disse o servidor.

O documento com supostas falhas foi levada ao presidente Bolsonaro no dia 20, segundo os depoentes. Entre 23 e 24 de março, o papel foi retificado duas vezes pela Precisa, a pedido dos técnicos do ministério, e passou a registrar que o desembolso só ocorreria após a chegada das doses.

Luis Miranda disse que não quis assinar os papéis exigidos para a importação por causa das falhas. Segundo o servidor, a fiscal do contrato Regina Célia Silva Oliveira, servidora da Saúde, deu aval para o processo seguir, mesmo com dados divergentes.

O papel ainda estava no nome da Madison e tinha erro no volume de doses que embarcaria ao Brasil, segundo Luis Miranda. O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), então, disse que a fiscal do contrato será convocada para depor.