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Padre goiano vira peça-chave em investigação de morte pelo FBI nos Estados Unidos
Estudioso de genealogia genética, Murah Rannier pode ajudar a solucionar um crime ocorrido há 20 anos
Desde que seu nome apareceu no domingo (8) em reportagem do Fantástico (TV Globo) sobre um caso que está sob investigação do FBI, o Departamento Federal de Investigação dos Estados Unidos, o padre goiano Murah Rannier Peixoto Vaz recebeu centenas de mensagens. À frente da Paróquia São João Batista, em Cumari, no sul do estado, o religioso é apaixonado pela genealogia genética e não foi por acaso que as características do seu DNA surgiram em meio às buscas por informações sobre restos mortais encontrados em 2005 numa chaminé de Boston, capital de Massachusetts.
Em novembro do ano passado, padre Murah, que está prestes a completar 38 anos, recebeu o telefonema de um primo que atua na área de segurança o alertando sobre o contato que o FBI faria com ele. “Meu primo avisou antes para me alertar que não era um trote”, conta Murah.
Àquela altura, a Polícia Civil de Goiás já tinha sido contatada por um adido da embaixada norte-americana no Brasil, que assumiu as buscas por possíveis parentes da mulher, uma brasileira, cuja ossada foi localizada em meio às cinzas quando um trabalhador fazia a limpeza da chaminé.
Na época, os investigadores disseram que a morte teria ocorrido três anos antes. Desde então o caso permanece sem conclusão. Usando tecnologia e a genética forense, os investigadores descobriram se tratar de uma mulher brasileira com idade entre 25 e 35 anos, cabelos pretos ou castanhos e que tinha dado à luz pelo menos uma vez. Após duas décadas o FBI tenta encerrar as investigações, buscando sites de genealogia genética, que mantêm dados de pessoas do mundo todo.
Os dados genéticos de padre Murah Rannier estavam no Get Match, um site norte-americano, onde qualquer pessoa pode inserir seu código de DNA, analisar resultados e fazer comparação com dados de outras pessoas. Foi assim que o FBI chegou até ele, no interior de Goiás, numa cidade com cerca de 3 mil habitantes. “Quando o FBI jogou os dados do DNA da mulher no site, o meu estava lá há mais tempo. Por isso, nem assustei quando meu primo ligou porque eu já sabia que poderia aparecer alguma coisa.” Além do seu próprio DNA, padre Murah administra no site dados de mais 14 parentes e está prestes a incluir mais dois.
Ele contou que, embora não tenha formação na área, sempre teve muito interesse em genealogia genética. “Em 2005 decidi pesquisar sobre minha família, mas em 2006 entrei para o seminário e não pude dar desenvolvimento”, relata.
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Padre Murah é um dos 12,4 mil membros do grupo DNA-Brasil Genealogia com Genética que, além de debater o tema, tem ajudado muita gente a desvendar seus históricos de consanguinidade. Como também integra o Comitê Goiano em Defesa da Vida, conta que estudou embriologia clínica para ter embasamento científico por se tratar de um tema polêmico.
“O que eu percebi é que o FBI não tem muita habilidade com as ferramentas de pesquisa de DNA. Acredito que, se tivessem nos passado o código, já teríamos decifrado o caso. Nosso grupo já solucionou várias histórias de pessoas adotadas ou que foram sequestradas e levadas para outros países. Estamos assistindo e torcendo para que tenham sorte.” O pároco de Cumari se encontrou com o adido norte-americano em dezembro de 2021, na sede da Polícia Civil de Ipameri. Na ocasião, ouviu que a compatibilidade de seu DNA com a ossada era de 0,54 centímetros.
“Na reportagem falaram em 0,34 cm, o que faz muita diferença. Até enviei uma mensagem para o agente porque, caso seja 0,54 pode ser que haja um trisavô ou até bisavô em comum, mas 0,34 a distorção é grande, é quase impossível ter um parentesco”, explica.
Lidando com sintomas leves da Covid-19, ele passou a segunda-feira (9) respondendo mensagens de amigos, familiares e pessoas com o mesmo interesse em genética. “Tem pessoas querendo detalhes de como fazer para inserir seus dados nos sites de genética, outros querem tirar temendo que sejam alvos de investigação”, revela.
Busca pelo passado acha rastros familiares em 1.500
Natural de Ipameri, padre Murah Rannier Peixoto Vaz é formado em Filosofia e Teologia por força do exercício do sacerdócio, mas sua curiosidade alcança outros patamares. Além de se dedicar à pesquisa da genealogia genética, ele é um apaixonado por história. Já escreveu vários livros, o último deles é No Sertão do São Marcos: Desenvolvimento Histórico do Município de Campo Alegre de Goiás, no qual inseriu dois capítulos sobre seus ancestrais.
Outras quatro obras estão em fase de preparação, uma delas sobre 35 sacerdotes que passaram pelo Sudeste goiano e o Triângulo Mineiro entre os séculos 19 e 20, e outra sobre como o município de Ipameri enfrentou a gripe espanhola no início do século 20. Nos próximos dias ele será um dos membros do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás (IHGG).
Nas pesquisas que vem realizando sobre sua própria família, o religioso já chegou a dados que se aproximam do ano de 1.500. “É preciso muita paciência, mas vou lendo os livros de registros, como os que existem na Torre do Tombo em Portugal, e vou encontrando as informações.”
Banco de dados de Goiás ajudou na busca
Administradora do Laboratório de Biologia e DNA Forense (LBDF) da Polícia Técnico-Científica de Goiás, a perita criminal Mariana Mota participou do processo de intermediação entre o FBI e a polícia goiana. O pedido de ajuda chegou à Delegacia de Investigações de Homicídios (DIH), que solicitou o apoio do LBDF. O perfil genético da ossada encontrada na chaminé norte-americana foi repassado a ela, que fez o estudo e repassou o resultado para a Polícia Federal do Brasil. “Este é o procedimento por envolver perfil genético de outro país.”
Mariana Mota orienta as pessoas que tenham familiares desaparecidos, tanto no Brasil quanto no exterior, que procurem postos da Polícia Técnico-Científica para doar seus dados genéticos. O DNA é inserido no banco de dados de perfis genéticos. Hoje, no banco nacional há 140 mil perfis e no de Goiás, 12 mil, que já ajudaram a desvendar quase 400 investigações criminais.
Por: Malu Longo / O Popular