Notícias
‘Denúncia é uma ficção’, diz Michel Temer em pronunciamento
Presidente falou à nação na tarde desta terça-feira (27) após ser denunciado pelo procurador-geral da República por corrupção passiva
Após o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, denunciar o presidente Michel Temer (PMDB) por corrupção passiva na segunda-feira (26), o chefe de Estado, por sua vez, decidiu se pronunciar sobre o caso nesta terça-feira (27).
Em tom bem-humorado e em determinados momentos irônico, o presidente disse que se sentiu no dever da fazer uma declaração. Preferiu não chamar de pronunciamento para não dar peso para denúncia, na qual considerou como uma “ficção”.
Com carreira na área jurídica, como ressaltou com mais de 40 anos de experiência, Temer relatou que sob o foco jurídico, a preocupação é “mínima”. “Não me impressiono com os fundamentos jurídicos e quem sabe até com a falta deles. Mas se fosse apenas o aspecto jurídico, não estaria fazendo o esclarecimento, o faço pela questão política”.
Ainda sobre a denúncia, o presidente avaliou como um “ataque injurioso”, que “reinventou o código penal, trazendo novas leis penais: as denúncias por ilação. É uma infâmia de natureza política. Fui denunciado por corrupção passiva a essa altura da vida, sem jamais ter recebido valores e não ter participado de acordos ilícitos. Onde estão as provas concretas de recebimento desses valores?”
Para ele essa é uma tentativa de atrapalhar a retomada econômica do Brasil e prejudicar a imagem política, uma vez que agora o “País está voltando aos trilhos”.
Primeira vez
Esta é a primeira vez na história da República brasileira que um presidente é acusado formalmente por crime de corrupção durante o exercício do mandato. Em 1992, Fernando Collor de Mello foi denunciado quando já estava afastado do cargo.
Se a denúncia for aceita pelo Supremo Tribunal Federal (STF), Temer se torna réu e fica afastado do cargo por 180 dias. Caso o processo não seja julgado nesse prazo, o presidente reassume as funções.
Denúncia
Na denúncia enviada ao STF na última segunda-feira, Janot pediu, além da condenação por corrupção, que os dois acusados — Temer e o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) — percam seus eventuais cargos de função pública – no caso de Temer, a Presidência – e indenização por “danos morais coletivos” no valor de R$ 10 milhões para Michel Temer e R$ 2 milhões para Loures.
Segundo Janot, Temer se valeu do cargo de presidente para receber vantagem indevida de R$ 500 mil, por meio do ex-deputado Rocha Loures, oferecida pelo empresário Joesley Batista, dono da JBS e cuja delação desencadeou a atual investigação contra o peemedebista. De acordo com a denúncia, Temer e Loures ainda “aceitaram a promessa” de vantagem indevida de R$ 38 milhões.
“Nota-se, assim, que são graves os ilícitos praticados pelos acusados, revelando os elementos dos autos que os envolvidos agiram com absoluto menoscabo [desprezo] e desrespeito à própria função de Presidente da República e de Deputado Federal que MICHEL TEMER e RODRIGO LOURES exercem, respectivamente, à coisa pública e aos valores republicanos, tudo a reforçar a necessidade de reparação de dano moral à coletividade”, diz um trecho da cota da denúncia – espécie de resumo – que já está no sistema do Supremo.
Segundo Janot, Temer “ludibriou os cidadãos brasileiros e, sobretudo, os eleitores, que escolheram a sua chapa para o cargo político mais importante do país, confiando mais de 54 milhões de votos nas últimas eleições”.
Sobre Loures, o procurador-geral diz que o peemedebista “violou a dignidade do cargo que ocupou como Deputado Federal. A cena do parlamentar correndo pela rua, carregando uma mala cheia de recursos espúrios, é uma afronta ao cidadão e ao cargo público que ocupava. Foi subserviente, valendo-se de seu cargo para servir de executor de práticas espúrias de Michel Temer”.
Ao longo da denúncia, as conversas gravadas por Joesley Batista e Ricardo Saud, executivo da JBS, com Temer e Loures são usadas para fundamentar as acusações. No entendimento da Procuradoria, o ex-deputado tratava com os empresários sempre em nome do presidente, chegando a mencioná-lo por diversas vezes.
“Rodrigo Loures, durante toda a empreitada criminosa, deixou claro e verbalizou que atuava em nome do Presidente Michel Temer, com a ciência deste, inclusive trazendo informações atualizadas a respeito das posições de Michel Temer acerca dos assuntos tratados, o que deixa claro que Rodrigo Loures se reportava de maneira permanente a Michel Temer sobre o andamento dos crimes perpetrados”, diz a denúncia.
Em outro trecho, Janot aponta que a propina tratada por Loures com os executivos da JBS se destinava ao presidente. “As provas trazidas aos autos reforçam a narrativa dos colaboradores de que em nenhum momento o destinatário final da propina era Rodrigo Loures. A vantagem indevida, em verdade, destinava-se a Michel Temer, a quem os colaboradores e o próprio Rodrigo Loures se referem como ‘chefe’ ou ‘Presidente'”.
Rodrigo Janot pediu que o STF, antes de encaminhar a denúncia à Câmara dos Deputados, dê prazo de 15 dias para que as defesas de Temer e Loures se manifestem.
A Procuradoria também pediu ao Supremo que autorize uma nova investigação contra Temer e Rodrigo Loures sobre um decreto presidencial para o setor de portos, assinado por Temer em maio. Durante a fase de investigação, a Polícia Federal gravou ligações de Loures nas quais o ex-deputado aparente intervir para conseguir modificações no decreto que poderiam beneficiar algumas empresas do setor. Em tese, essa nova frente de apuração também pode dar a origem a uma nova denúncia.
Por fim, a PGR pediu a remessa dos autos para o Ministério Público Federal em Brasília, para que sejam investigadas suspeitas sobre a atuação de funcionários do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e da Petrobras.